Quem responde por acidentes no estacionamento


Avarias ou furtos de automóveis deixados em estacionamentos, gratuitos ou não, de estabelecimentos comerciais deixam, em geral, o cliente desamparado. É que, apesar de comum, esses eventos remetem ainda ao polêmico tema sobre a responsabilidade ou não do estabelecimento pelo sinistro. Persistem ainda algumas dúvidas sobre o assunto, dizem advogados.
De acordo com especialistas, os fornecedores têm responsabilidade. "A jurisprudência é pacífica no sentido de que quaisquer estabelecimentos comerciais que disponibilizem estacionamento, ainda que gratuito, são responsáveis por indenizar o consumidor em caso de furto, roubo ou quaisquer outros danos. Já existe até Súmula do STJ (Superior Tribunal de Justiça) nesse sentido", comenta Silvia Zeigler, advogada especialista em direito do consumidor, do escritório Albino Advogados Associados. De acordo com ela, a Justiça vem decidindo a favor do consumidor diante de ocorrências desse tipo.
"Há várias sentenças de turmas recursais de Juizados Especiais Cíveis (JEC) de alguns estados que mantiveram decisões favoráveis ao consumidor", reforça Maria Inês Dolci, coordenadora-jurídica da Pro Teste. A turma recursal é a última instância do JEC, ou seja, a responsável pelas decisões definitivas.
Os advogados explicam que os tribunais de Justiça têm decidido em favor dos consumidores porque entendem que há, no caso, responsabilidade objetiva. Ou seja, o espaço para estacionar é considerado um serviço oferecido pelas empresas, portanto os estabelecimentos são responsáveis pelos riscos do serviço que oferecem, explica Maria Inês. "Se a pessoa deixa o carro em um espaço cedido, presume que deva haver segurança e vigilância", comenta Carlos Alberto Nahas, assistente de direção do Procon-SP.
"Mesmo em casos de assalto a mão armada a Justiça tem sido favorável ao consumidor por conta da responsabilidade objetiva. Independe da culpa do estabelecimento, se o fornecedor disponibiliza o serviço é responsável por tudo o que ocorre ali", acrescenta Silvia. A advogada diz, ainda, que no município de São Paulo os estacionamentos pagos (inclusive os vallets) são obrigados por lei a ter seguro contra furto, roubo, incêndio e perda total. Os shoppings, supermercados e lojas que ofereçam estacionamento com mais de 50 vagas também precisam cumprir essa obrigação. "A exigência do seguro se presta a garantir que o estabelecimento terá condições de arcar com os prejuízos do consumidor", explica Silvia.
A dificuldade que os consumidores enfrentam, em muitos casos, é provar que o veículo foi furtado ou sofreu prejuízos no estacionamento. É fundamental ter a nota fiscal de compra no estabelecimento, o tíquete do estacionamento e testemunhas. Assim que perceber o ocorrido, o cliente deverá procurar a administração da loja, supermercado ou shopping, fazer um registro por escrito (pode ser de próprio punho) e dar um prazo para que a empresa se manifeste. Se não houver acordo, o consumidor deverá procurar a Justiça munido das provas.
Um boletim de ocorrência (BO) também deverá ser feito. Dependendo da gravidade do caso, é recomendável acionar a polícia já no local de ocorrência do evento. "É importante deixar claro que o consumidor que agir de má-fé responderá civil e penalmente", lembra Maria Inês, da Pro Teste.
Fúlvio Fernando Freire dos Santos quer ser ressarcido pelo prejuízo que sofreu quando parou o carro no estacionamento de uma das lojas da rede C&C Casa e Construção (na Avenida Prof. Francisco Morato) para fazer uma compra.
"Não desci do carro porque seria rápido. Pedi para minha namorada comprar uma lixa e, enquanto eu esperava, fui rendido por dois homens. Um deles estava armado e sofri seqüestro relâmpago. Algum tempo depois me deixaram em local distante. Levaram o carro e outros pertences", conta. "Dias depois encontraram meu carro no litoral. Havia sido usado para um assalto. Faltavam pertences: o rádio, uma coleção de CD’s e uma furadeira", detalha.
Fernando quer ser ressarcido pelo roubo dos bens. "Já no dia seguinte do ocorrido voltei à loja para reclamar da falta de segurança. O estacionamento não é cercado. É uma loja de esquina e as vagas ficam em frente. É um estacionamento da loja e havia até um segurança à paisana." O consumidor fez um boletim de ocorrência (BO) e também pediu que o responsável por aquela loja da C&C elaborasse um documento em papel timbrado do estabelecimento descrevendo o ocorrido.
A C&C, em nota ao estado, diz que o cliente foi contatado pela Central de Atendimento da rede, em 17 de novembro de 2004 (cinco dias após o registro da ocorrência na loja), e "informado de que não seria possível atender a solicitação de ressarcimento devido ao fato ocorrido tratar-se de um crime, fato esse inerente à violência urbana, e que não é possível ao estabelecimento comercial prever ou interromper a ação do meliante".
Advogados especializados afirmam se tratar de um caso que apresenta particularidades, mas que o consumidor deve procurar a avaliação da Justiça. De acordo com especialistas, mesmo não sendo possível evitar a violência em algumas situações, existe espaço para pedir ressarcimento. "Ao oferecer um serviço como esse, a empresa tem o dever de equipar o local com um sistema de segurança mais adequado possível para que o cliente possa desfrutar da facilidade", comenta Maria Inês Dolci, da Pro Teste.
"Se a loja disponibiliza o espaço para clientes, é um espaço da loja. Há responsabilidade objetiva, não dá para excluí-la. Mas há peculiaridades nesse caso que precisam ser apreciadas pelo Judiciário", opina a advogada Maíra Feltrin, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Carlos Alberto Nahas, do Procon-SP, diz que, se o estacionamento (mesmo sem cerca) está em terreno anexo à loja e é oferecido pelo estabelecimento, há responsabilidade. "Ficaria mais complicado se fosse um terreno não anexo à loja. O cliente poderia não ter ido ao estabelecimento."
(O Estado de S. Paulo)

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